Aventura: Segunda Chance

Misaki sabia que não tinha mais lugar entre os humanos e estava condenada a uma vida de solidão. Ela ainda estava se adaptando à sua nova aparência, já que seus traços demoníacos a tornavam quase irreconhecível à garota que uma vez fora. Apesar de tudo, sua morte lhe trouxe uma oportunidade de se tornar forte e viver uma vida sem se preocupar com o gênero que nasceu. Ela recebeu uma segunda chance de viver, e era melhor não despertiçá-la.

O Sol estava se pondo sobre a densa floresta, tingindo o céu com tons quentes de laranja e vermelho enquanto as sombras alongavam-se entre as árvores altas e a folhagem densa. A garota se encontrava há algumas horas de Utakata, perdida e sem um rumo claro para sua vida. Sua caminhada era tranquila e harmônica, com sons de pássaros cantando, animais pequenos caminhando pela floresta e até o som do fluir das águas de um riacho próximo.

No entanto, caminhando em direção ao norte, ela escutou um som que perturbava tal harmonia. Eram sons que ela conhecia muito bem da época em que ainda era uma guarda de Utakata. Era o som de tumulto humano, vozes carregadas de tensão e urgência. O som de uma luta ecoava na direção norte.

O garoto parecia ansioso com suas palavras e um semblante de incerteza estava estampado em seu rosto. Sua mãe tinha acabado de ser morta, e a única pessoa que ele poderia confiar era uma Oni que já tinha ameaçado o comer mais de uma vez. Tudo... tudo bem. Estarei sob seus cuidados. – ele fez uma pequena referência, como um gesto de educação.

Ele começava a camiar em direção à você, parando a uns dois metros, como se assustado demais para chegar muito perto.

Não... já passou. – ele olhava para baixo, ainda com o rosto vermelho. Claro, ninguém em sã consciência abraçaria um monstro que ameaçou devorá-lo segundos atrás, mas não parecia ser esse o único motivo.

Um guerreiro honrado nunca se esconde... – ele tentava forçar uma voz determinada ao responder sua outra pergunta, mas falhava dado à dureza de sua situação. Pela aparência física, ele parecia ter por volta de dez anos e tinha um corpo saudável, mas era magro e pequeno. Por causa de seu tamanho, porém, ele conseguiria sim se esconder caso desejasse.

Meu pai morreu como um guerreiro, então mamãe nunca me deixou treinar para seguir os passos dele. – ele se explicava, deixando bem claro que não sabia lutar. Era irônico, porém, que em uma tentativa de protegê-lo, sua mãe falhou em prepará-lo para o mundo cruel que ele viveria sem ela a partir de hoje. Quem diria... amor demais pode matar alguém!

Ele caminha até você, parando à sua frente por alguns segundos, como se ainda estivesse hesitando. Então ele estende a mão, oferecendo-a para que você a segure.

Misaki segurava a mão do garoto com uma gentileza surpreendente. Não é medo, é só... – na pausa, ele virava o rosto, como se tentando inventar uma boa desculpa. Ele assentiu a cabeça, encontrando a palavra que queria – Cautela. Guerreiros devem ser cautelosos!

Vocês caminham na mesma direção que a carroça estava indo. Após andar por uns vinte minutos, estava um pouco monótono. O garoto não dizia nada, ainda em profunda melancolia. Ou talvez só estivesse com medo- digo...sendo cauteloso para não irritar a Oni. O Sol ainda que visível, estava a um fio de sumir no horizonte.

Estamos perto... eu acho – ele comentava em um tom neutro enquanto caminhava ao seu lado. Ele parecia nervoso quando lhe viu sorrindo, como se sentisse ser um mau presságio. Poucos segundos depois, ele pareceu ganhar coragem para falar – Eu... eu posso...  posso te fazer uma pergunta?

Ele olhou para Misaki com um olhar apreensivo. Meu pai está morto... ele tinha seus pecados, ou ao menos era o que dizia minha mãe. Mas ela não... ela era... um raio de Sol. Ela morreu bem na minha frente, nos meus braços. E aqui estou eu sendo escoltado por um demônio. É... tão estranho, acho que ainda não estou acreditando no que aconteceu... isso aqui... não é um pesadelo, é? – seu rosto parecia magoado e a pergunta era quase que retórica, mas ele ainda olhava para a garota à espera de uma resposta.

Haru olhou para Misaki, seus olhos expressando a angústia que estava sentindo. Suas palavras eram duras... mas ele precisava delas para sobreviver em um mundo cruel, onde o mais forte impõe sua vontade sobre os mais fracos. É... difícil de aceitar tudo isso. – seu rosto abaixou, encarando o solo do caminho à frente. Não é solitário? Digo... viver como um demônio. Devem existir outras maneiras de ficar forte, não é? – seu rosto estava sério, mas havia uma curiosidade genuína em seus olhos.

Certo... – ele assentia com a cabeça. Eu acho que... ah! – o garoto acabou tropeçando em alguma coisa e caindo de cara no chão. Ai... eu tô bem – ele cuspia e esfregava o rosto que agora estava sujo de terra. No chão, havia alguma protuberância feita de madeira, só com uma de suas pontas para o lado de fora.

Misaki se aproxima do item de madeira e percebe que se tratava da ponta de uma pequena caixa. Olhando mais de perto, também havia próximo alguma protuberância metálica, pertencente a uma ferramenta. Não pareciam estar enterrados profundamente, então seria possível usar mãos para escavar.

Misaki escava os arredores do objeto, conseguindo retirar da terra uma caixa de madeira e uma picareta, que estava em boas condições apesar da sujeira. Ao abrir a caixa que cabia na palma da sua mão, você acaba encontrando uma espécie de guizo, com uma alga o cobrindo. O garoto olhava curioso para seu achado – Como será que isso foi parar aqui?

Um pouco de terra se impregnava em suas unhas, lhe deixando um pouco desconfortável. O céu também escurecia, abandonando a tonalidade laranja e abraçando uma coloração negra e cinzenta. Enquanto isso, o garoto se distanciava de você, olhando em direção ao monte, como se procurasse alguma coisa.

• Kekken no Suzu
• Alga
• Picareta

Eu acho... eu acho que chegamos! – ele reparava na arma que era entregue a ele. Com um olhar de incerteza, ele agarra o cabo da Tanto e a guarda em suas vestes. Ele retornou o olhar lá para cima da colina, onde havia uma árvore sem folhas, com a extremidade em formato de foice. Não era particularmente chamativa, mas ela parecia ser especial para o garoto. No entanto, havia um problema... para alcançar o topo, era necessário escalar cerca de quatro metros. Para uma Oni atlética como Misaki, isso não seria um problema, mas para uma criança...

O Tio Taka conseguia me levar nos braços e caminhar até lá em cima... mas ele tinha alguma técnica ninja super secreta. – Haru murmurou, olhando para a colina com um certo receio. Engoliu em seco, deslizando os dedos pela parede de terra rígida que continha algumas rochas protuberantes, oferecendo pontos de apoio para escalar. Ele estava claramente pensando em tentar, mas havia um toque de apreensão em seu rosto. Essa escalada poderia dar muito errado para o garoto.

O garoto encara o morro com o rosto apreensivo, enquanto Misaki começava a escalada, produzindo um estrondo a cada vez que fincava as mãos na terra rígida. Motivado pela coragem da Oni, ele decide seguir atrás dela, consideravelmente mais lento. A pequena demônio, porém, decide ajudá-lo, carregando Haru com uma mão como se ele não pesasse nada. Isso, pelo menos, antes de jogá-lo até o topo, onde ele caiu firmemente de bunda no chão. Ai... – você chegava a tempo de vê-lo esfregar a bunda em dor.

De pé, ele apontava para um caminho adiante, onde havia menor densidade de mata. Hmmm... não sei, acho que sim? – ele respondia Misaki, caminhando pelo rumo que acreditava ser o correto. A única luz visível era uma brilhante, vinda do luar. Essa porém, era consumida diante da escuridão da trilha adiante.