Aventura: O Resgate

Você recebeu um contrato de um de seus contatos para assassinar um sacerdote. Era um homem corrupto, que abusava da fé alheia para roubar dinheiro dos menos afortunados. O trabalho parecia simples, uma morte sorrateira, como tantas outras. Horas se passaram em observação, até que o momento perfeito surgiu, quando ele estava sozinho e embriagado em sua casa. Porém o destino lhe guardou uma surpresa amarga. Quando estava prestes a cometer o assassinato, homens trajados religiosamente surgiram por dentro de cômodos fechados da casa, um deles aparentava ser particularmente poderoso. À sombra da noite, uma armadilha foi tecida, tramada por um antigo contato que havia se voltado contra você.

Vítima de uma traição, não viu alternativas se não fugir. Mesmo cercado, você encontrou uma abertura e saltou pela janela, partindo em direção à floresta logo ao norte da casa em que estava. Em sua fuga, porém, foi atingido por uma magia estranha. Ela não lhe feriu, mas fez seu corpo pinicar em cada canto, como se estivesse sendo observado por todas as direções.

Na floresta, era escuro e difícil de enxergar. Mas não pôde relaxar, pois a poucos metros atrás, uma intensa luz irrompia da arma daquele poderoso sacerdote, que estava em sua perseguição. Subitamente, porém, você sentiu o som dos passos dele diminuir. Ele gritou a seus homens, enquanto você seguia em frente – Ele está entrando na Floresta da Bruxa. Vamos contornar, ele não tem por onde fugir. Ele pareceu confiante, talvez algo relacionado à magia que lhe atingiu. De qualquer maneira, eles não pareciam mais perseguir você, como se temessem algo dentro daquela floresta sombria. Diante da escuridão, a luz do luar revelava uma trilha à sua frente, tecendo um fio prateado de esperança, como um convite da noite, apontando o caminho para algum lugar desconhecido.

Você brande sua arma, desferindo um corte no ar, deixando a lâmina reluzente. Antes de guardá-la, você vê seu próprio rosto sob a luz do luar no reflexo da lâmina, com seus olhos vermelhos irradiando com uma intensidade comparável à própria lua. Você segue em seu caminho com o devido cuidado. A lâmina retorna ao seu abrigo, e você continua, cada passo carregado de uma destreza que beira a invisibilidade no chão áspero e terroso.

Eventualmente, você alcança uma cabana no meio da floresta. Aqueles familiarizados com algum dos filmes de terror ergueriam um alerta contra se aproximar, mas claro, sua existência precede em séculos a concepção de tais filmes. A cabana era produzida a partir de maneira escura. Seu tamanho era modesto, sugerindo dois ou três compartimentos no máximo. Uma luz típica de velas, surgia de uma das janelas. A trilha subia, percorrendo até um pequeno monte, coroado pela cabana.

Você se esgueira em direção da casa em busca de abrigo e comida. Se aproximando, você escuta uma melodia encantadora, executada com maestria em um instrumento de cordas japonês. Seu corpo estava praticamente morto, porém a cada nota que soava, seu corpo parecia aquecer, trazendo-o uma estranha paz e tranquilidade, um sentimento porventura desconhecido, ou no mínimo incomum para Yamato. Em algum momento, o conforto da música pareceu sobrepor o mal-estar gerado pela magia que lhe atingiu mais cedo.

Olhando mais de perto, era possível ver a cabana em maior detalhe. A madeira escura que formava as paredes estava entrelaçada com vinhas, como se a própria floresta estivesse tentando reivindicar a estrutura de volta para si. Não havia cercados ou muros ao redor da casa, apenas a trilha que por sua vez era cercada por uma grama baixa e algumas árvores. Em seu topo, havia um ninho largo com um único corvo em sono profundo.

A casa possuía duas janelas. Da primeira, você via luzes surgindo do mesmo local de onde vinha a melodia, com um sutil cheiro de incenso pairando no ar. Da segunda, era um cômodo escuro. O aroma vindo do segundo quarto era peculiar, porém inconfundível: era o cheiro de sangue.

Obs.: Ao olhar dentro da casa, faça um teste de Vontade ou Inteligência (a seu critério).

Confuso e desnorteado, Yamato morde a própria mão com força a ponto de arrancar sangue. A música continua inabalável, mas ela não parece ter o mesmo efeito agradável sobre você. Sua mão sangrava, mas a ferida fecharia em breve.

Você olha pela janela que estava aberta e vê um pequeno quarto escuro, com uma fraca luz trêmula escapando da fresta debaixo da porta. A visão de dentro do quarto era um desenho de pentagrama, com velas apagadas dispostas em cada um de seus vértices. No centro do desenho, porém, havia alguém deitado. Era um jovem, ele estava seminu, com inscrições estranhas em seu corpo e com sangue escorrendo de alguns cortes, formando uma pequena poça ao seu entorno. Seus braços e pernas estavam abertos, imóveis. Seu peito, porém, se elevava e abaixava ocasionalmente, indicando que estava vivo... por pouco.

O aroma inebriante e metálico de sangue pairava no ar, quase como se convidasse o pequeno demônio a jantar do corpo que jazia no centro do quarto. A aparência e cheiro eram deliciosos, fazendo sua boca salivar.

Yamato avançou pela casa, dirigindo-se ao centro onde o homem seminu estava. Estando mais próximo, você repara em um novo detalhe: vestes escuras, semelhantes às dos homens que o perseguiam, estavam dispostas em um canto, perfeitamente dobradas. Era evidente que se tratava de algum ritual. Mas por que ele não tinha sido concluído?

Você se aproxima do homem e vê que os olhos dele estavam completamente brancos, como se estivesse em um transe. Você tenta acordá-lo com alguns tapas, mas o homem permaneceu imóvel. Nesse momento, a música que vinha da sala ao lado abruptamente cessou, mergulhando a cabana em um completo silêncio.

Yamato se move em direção à porta, se posicionando ao seu lado, preparado para uma emboscada. Quando a porta se abre, luminosidade e um forte cheiro de incenso invadem o quarto escuro e um vulto surge atrás da porta. No entanto, o vulto dá meia volta e você escuta passos tranquilos retornando para o canto do outro quarto. A porta permanecia aberta e os silêncio reinava nos dois quartos.

Yamato desembainhou sua espada, investindo ferozmente em direção ao vulto desconhecido. O vulto, que estava do outro lado da porta virou-se no último instante, mas não teve tempo para reagir, sendo derrubado no chão. Era um homem comum, porém com olhos completamente brancos. Ele permanecia parado como se fosse incapaz de agir por conta própria.

Olhando para a sala iluminada, Yamato notou duas portas visíveis além daquela pela qual ele tinha entrado. Uma levava à entrada da casa, enquanto a outra parecia levar a outro quarto, sem janelas. No centro da sala estava uma mulher. Sua pele era pálida, com sardas formando uma ponte em seu nariz. Ela possuía um cabelo escuro e comprido, com tons esverdeados e trajava um belo Yukata. No entanto, apesar de sua aparência comum, Yamato logo percebeu algo de errado [Dado: 21]. O jovem Yokai encarou fixamente a mulher, recusando-se a ser enganado por qualquer ilusão. Havia algo de errado com os olhos dela: eles brilhavam com uma intensidade incandescente de vermelho. Ela não era uma mulher comum, e sim uma criatura demoníaca, assim como Yamato, um monstro horrível e sem coração.

Ela sentava serenamente sobre uma almofada, atrás de uma mesa quadrada onde uma xícara de chá descansava. Haviam três assentos vazios ao redor. Ela tomou um gole da xícara com elegância antes de repousá-lo sobre a mesa. É raro receber visitantes que optam entrar pela janela. Mas, enfim... sente-se, tome uma xícara. Hiroshi deverá chegar em breve com nossa refeição. –  ela falou em tom cortês. Apesar da educação, havia um ar estranho sobre ela, não lhe permitindo se sentir confortável.

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Yamato sabia melhor do que mexer com outros demônios. Ele rejeita a proposta da dona da cabana, caminhando em direção à porta. A cada passo que ele dava, porém, a cabana parecia tremer por inteiro, com maior intensidade a cada passo. Por favor, fique só para ouvir minha proposta. – a voz dela soou, silenciando os tremores por completo.

A senhora pronunciava as palavras com tranquilidade, no entanto, havia uma sombra quase imperceptível de desespero oculta em suas palavras. Preciso de alguém para resgatar o que me foi roubado. E, é claro, aquele que realizar essa tarefa será generosamente recompensado pelos seus serviços.

Minha liberdade. – ela pronunciou as palavras com um tom de melancolia, talvez com uma pitada de rancor. Seu rosto e postura eram inabaláveis, porém. Estou em cativeiro nesta floresta há muito tempo. Por circunstâncias que ocorreram em minha vida, tive de realizar um pacto mágico que me prendeu aqui, e essa magia foi selada em um objeto, formando uma espécie de contrato. Eu peço que vá atrás desse objeto e traga-o até mim, para que eu possa desfazer esse contrato.

Ela fechou os olhos, deixando o cômodo em silêncio por alguns segundos – Meu querido esposo. Ela retornou a olhar para Yamato com aqueles belos olhos rubros carregados de uma profunda melancolia. Ele costumava ser o líder desses fanáticos religiosos antes de aposentar. – ela encarou o acólito que, ainda em transe, estava imóvel no chão da sala.

Quando ganhei esse belo par de olhos... ele não teve coragem de me matar, mas também não podia permitir que uma criatura horrível como eu vagasse livremente. Então ele me selou aqui, onde tenho vivido em solidão por muitos anos. Estou exausta... – ela suspirou, delicadamente deslizando a mão até a xícara de chá, tomando um gole.

Pedi então que resgatasse um objeto, mas o que peço verdadeiramente... é um resgate para mim mesma. – ela terminava sua fala repousando a xícara sobre a mesa. Suas palavras soavam genuínas, mas havia lacunas em sua história. Caberia à Yamato decidir o quanto poderia confiar nela.

Ela desviou o olhar. Nosso casamento foi arranjado, mas seu sonho era viajar o mundo. Ele não parava em casa... nem quando nosso filho nasceu. O demônio me atacou o fez por vingança. É por isso que estou viva... ou quase. – sua postura pareceu fraquejar ao mencionar a criança que tiveram.

Ele foi negligente em seu papel como marido e pai... e por um tempo eu acreditei que o odiava. Mas recentemente chegou aos meus ouvidos que ele está terminalmente doente... e descobri que ainda o amava. – ela retornou o olhar para você, balançando a cabeça. O olhar dela pareceu renovar de vida e sua voz soou com força – Odeio drama e já sofri o bastante por isso. Eu só quero sair desse lugar. Se você invadir o templo e recuperar o item que preciso... eu lhe darei um prêmio especial.

Ao escutar sua ameaça, o olhar dela se tornou frio. A cabana começou a vibrar por alguns segundos, e o homem hipnotizado levantou do chão, como um fantoche à espera de ordens. Do lado de fora era possível ouvir um bater de asas. A vibração deu fim quando a voz da mulher ecoou pelo quarto. Você pode tentar, mas lembre-se que estou no meu domínio. – era como o ambiente respondesse à vontade dela. Poderia não ser uma boa ideia enfrentá-la nessa floresta.

Ele está de cama em seus últimos suspiros, não lutaria nem se quisesse. – não estava claro se isso era algo bom ou ruim para ela. Meu esposo criou um discípulo, mas este nunca alcançou suas expectativas. É um rapaz inteligente, mas... – ela interrompeu sua frase, como se algo tivesse acontecido. ...não posso dizer o mesmo das pessoas que o seguem. Há três homens e uma mulher se aproximando de minha floresta nesse momento – ela se levantou, colocando um leve sorriso sobre o rosto.

Não é a primeira vez... – ela apontou a mão para o acólito hipnotizado. Você pode me atacar... ou podemos nos livrar deles juntos. Para eles, somos monstros sem coração... e eles não estão necessariamente errados. Mas nunca se sabe se você vai ser o próximo. Yamato poderia atacá-la, fugir ou se unir a ela... ao menos por hora.

A senhora acenou para você, permitindo que deixasse a cabana. Ainda era noite, mas a lua brilhava sobre a floresta, permitindo que enxergasse, de certo modo. Yamato poderia seguir pela a trilha que veio ou tentar a sorte por outro caminho.