Missão: Proteja o Acampamento

O ar pesado do acampamento era temperado pelo aroma terroso da madeira queimada, misturado ao vapor da sopa quente que os lenhadores compartilhavam. Saori estava em silêncio, sentada próxima à fogueira, sua presença perturbando a calmaria do local como uma pedra lançada em águas tranquilas. O lenhador a seu lado a observava com olhares furtivos, tentando não encarar diretamente, como se temesse que ela pudesse perceber o desconforto que ele emanava.

A sacerdotisa ajustava suas vestes com a paciência de quem já estava acostumada com o julgamento alheio. Não era a primeira vez que sua mera existência causava murmúrios e olhares desconfiados, e não seria a última. Antes que pudesse refletir mais, o som de passos que se aproximavam quebrou o breve devaneio. O jovem de cabelos ruivos chegou com um sorriso caloroso, cumprimentando os trabalhadores um a um. Sua postura amistosa contrastava com a tensão do lugar, como se ele fosse alheio à gravidade que o momento trazia.

Saori acompanhou seus movimentos com o canto dos olhos, curiosa com a facilidade com que ele interagia com os aldeões. Era raro ver alguém com tanta naturalidade em meio à desconfiança e ao receio que, inevitavelmente, sua presença trazia.

Quando Subaru finalmente parou diante dela, oferecendo uma reverência respeitosa, a surpresa de Saori foi palpável. Não esperava um gesto tão genuíno, muito menos de um estranho. Por um breve momento, esqueceu os cochichos e os olhares evitados. Um sorriso sincero curvou seus lábios, suave como o primeiro raio de sol após uma noite fria.

Em silêncio, ela se levantou, com os movimentos graciosos de quem carrega o peso da tradição. Indicou o arco que repousava ao seu lado, a madeira polida refletindo o brilho suave da fogueira: era com isso que ela "costumava brigar".

"Saori, sacerdotisa de Amaterasu", apresentou-se de maneira tranquila.

Havia algo quase simbólico naquele momento. Entre a reverência do jovem e o sorriso raro da Raposa, uma ponte parecia ter sido construída, ainda que frágil, no meio da desconfiança que pairava ao redor.

Saori caminhava alguns passos atrás de Subaru, o movimento leve de seus pés quase inaudível contra a terra batida. A atmosfera ao redor era densa, impregnada pelo cheiro de fumaça e ferro. Os cochichos que antes preenchiam o ambiente cessaram, substituídos pela voz grave de Satoshi, que os guiava.

O ceticismo do lenhador não a surpreendia. Rostos como o dele, moldados pela dureza da vida em tempos de guerra, eram comuns em seu caminho. Contudo, havia algo em sua postura — a hesitação, o olhar que nunca fixava diretamente nos olhos, mas sondava os cantos como se esperasse algo à espreita — que chamava sua atenção.

"Dois guerreiros podem não parecer suficientes, Satoshi-san", sua entonação era suave, fluida como água deslizando entre rochas. "Mas a força de um grupo não está apenas em seu número; está no cuidado que temos uns com os outros. E aqui, a proteção do acampamento é nossa prioridade." As palavras eram escolhidas com precisão, moldando-se não apenas como um pedido, mas como uma promessa velada de segurança.

Enquanto Subaru conduzia a conversa, Saori deixou que sua presença caíssem em silêncio, apenas o som do vento e do crepitar distante da fogueira preenchendo o espaço entre eles. Seus olhos violeta, carregados de uma atenção que desmentia a serenidade de seu semblante, varreram as tendas desgastadas e o terreno ao redor. Ela perscrutava o perímetro na tentativa de absorver detalhes não ditos.

Logo, a Raposa se voltou para Satoshi, inclinando levemente a cabeça em sinal de respeito, sem desviar da intensidade de sua análise. Seu tom ordeiro, porém certeiro, carregava um significado implícito:

"Se tiver algo mais a nos contar, faremos bom uso. Afinal, quanto mais sabemos, melhor protegemos."

Havia em sua postura um equilíbrio sutil entre cortesia e firmeza.

A sacerdotisa assentiu à sugestão de seu companheiro embora tenha permanecido calada e reflexiva, deixando o frio penetrante morder suas bochechas enquanto continuava observando o acampamento. Os olhos violeta pousaram na fogueira central, onde, horas antes, o odor marcante de sopa quente e lenha queimada haviam saudado sua chegada. O cheiro não fora particularmente forte para ela na ocasião, mas agora, com os comentários de Satoshi e o cadáver do lobo tão próximo, a memória se tornava mais nítida.

As tendas desgastadas, as ferramentas espalhadas e os rostos cansados dos trabalhadores contavam uma história de resistência, mas também de fragilidade. Não eram apenas as feridas físicas que marcavam aquelas pessoas — eram as noites de vigília e o medo constante de algo à espreita na escuridão.

Saori estreitou os olhos, focando na vala onde o corpo do lobo repousava.

"Subaru-san, Satoshi-san..." começou, calmamente, mas havia um peso calculado em suas palavras. "Se o cheiro da comida nos expõe, precisamos controlá-lo. Revezar a vigia é importante, mas é uma solução de curto prazo. Precisamos de algo mais estratégico."

Seus pensamentos eram peças de um quebra-cabeça tentando encontrar as lacunas certas.

"Parte da carne desse lobo ainda deve estar preservada pela neve. Podemos usá-la para criar iscas afastadas do acampamento, em pontos estratégicos que desviem os predadores. Ossos e restos dispostos de forma a mantê-los ocupados longe daqui."

Ela fez uma breve pausa, voltando-se para a fogueira.

"Além disso, precisamos mascarar o cheiro daqui. Pequenas tochas ao redor do perímetro, usando madeira seca misturada com ervas amargas, devem confundir o faro dos predadores. O mesmo vale para a fogueira central", uma camada de ervas amargas pode disfarçar o odor humano e o de comida.

Seus passos eram lentos, comedidos, enquanto examinava o perímetro ao redor das tendas. As palavras finais vieram como uma combinação de pragmatismo e um leve tom de esperança.

"Se agirmos rápido, talvez tenhamos mais do que apenas vigilância esta noite. Talvez possamos, de fato, descansar."

Mas a ironia dessas palavras não passou despercebida por ela mesma. Descanso era algo que sua mente raramente permitia, um luxo que não combinava com os pesadelos de sua alma.